Data: 05/11/2019
Local: Casa Firjan
O espaço Aquário da Casa Firjan recebeu no dia 05 de novembro de 2019 os professores Christian du Tertre (presidente do Instituto Europeu da Economia da Funcionalidade e da Cooperação e professor da Paris VII) e François Hubault (Sócio fundados do laboratório de pesquisa e intervenção de empresas ATEMIS e professor da Paris I), sob mediação do Francisco Duarte (coordenador do programa de Eng de Produção da Coppe/UFRJ). Abordaram tópicos e proposições da Economia da Funcionalidade e da Cooperação. Durante duas horas, trataram das bases da EFC, de seus percursos, adesão e aderência de pequenas e grandes empresas. Trouxeram também a distinção da EFC frente a outras abordagens contemporâneas e das “novas” economias.
Algumas questões foram propostas pelo Prof Francisco Duarte, como a distinção da EFC com outros economias; quanto a aderência da EFC às grandes empresas; e quanto as vantagens da implementação da EFC em pequenas empresas, abordando conceitos e exemplos.
- Distinção com outras “novas economias”: colaborativa, cooperativa e circular.
Economia Colaborativa: economia das plataformas globais (ex: Airbnb, Uber). Lógica de industrialização dos serviços. Fica no controle de atores financeiros e desestabiliza economicamente territórios (ex. o Airbnb desorganiza o sistema de hotelaria e outros sistemas locais). É colaborativa, porém, não é cooperativa (há um desvio semântico). Sua dinâmica é composta por demandas estáveis e padronizadas, que podem ser atendidas a qualquer momento. A solução seria plataformas territoriais. A perspectiva territorial retira o poder financeiro desses atores e coloca a lógica servicial no cerne da questão. A Economia da Funcionalidade e da Cooperação (EFC) retira da lógica de volume. A cooperação é realizada de sujeito a sujeito, tendo o consumidor como prescritor, cooperando e se estendendo com o trabalhador.
Economia Circular também não consegue romper com a lógica de volume. Não há mudanças no ponto de vista financeiro, pois o controle continua entre grandes grupos empresariais. Existe uma criação de valor sem a preocupação com as questões do trabalho, pois é fechada na lógica industrial tradicional. A EFC desvia da lógica do volume e insere o valor do trabalho no processo.
Inovação no trabalho: 250 anos de história. Ligado a uma história mecânica. A inovação tecnológica é secundária na EFC. A ideia de que a inovação leva diretamente ao progresso econômico e social é uma ideia equivocada, pois dependerá da condição de uso e da ligação entre as relações sociais e de trabalho. A introdução de novas tecnologias no contexto servicial será possível se o seu uso trouxer melhorias. A lógica servicial é indivisível (ou é ou não é), e se utiliza da inovação tecnológica como suporte e apoio técnico (a trajetória é mais importante que o resultado).
Lógica Servicial x Lógica Industrial: no modelo tradicional, a captação de valor nas empresas é sequencial e divisível (divisão de tarefas; separação de processo e produto; vários elos/conjuntos).
- A aderência de grandes empresas à EFC é possível?
Exemplo da empresa Gaz de France: valor indexado ao volume de gás vendido. As questões ambientais fizeram repensar na lógica de volume, pois é contraditório. Ao analisar por quais vias poderia ser repensada tais questões, encontrou-se como resposta a venda de conforto térmico. Exemplo: 20° c para salas e escritórios. Não é vendido gás e sim o conforto térmico, trazendo como consequência a redução no fornecimento e consumo de gás. Para isto, foi necessário analisar o espaço e entender o cliente. No modelo econômico proposto pela EFC, para tornar possível o compartilhamento do conforto térmico, é preciso que o interesse seja de todos na busca pelo menor consumo de gás. A solução é uma gestão que tenha como consequência um efeito sistêmico. Quando a empresa foi comprada, a implementação da EFC na Gaz de France foi interrompida, pois houve oposição entre empresa e acionistas. É preciso entender que a trajetória da EFC é longa, e houve uma decisão de curto prazo do setor financeiro da empresa, desconsiderando um trabalho de 4 anos.
- Vantagens da implementação da EFC em pequenas empresas:
Não existem cortes financeiros como o ocorrido na Gaz de France, além de ter uma maior probabilidade de encontrar dirigentes preocupados com os problemas atuais do mundo e suas questões. Há uma possibilidade maior de identificação com essas demandas, não havendo busca por uma rentabilidade máxima.
Economia Industrial: grandes grupos globais e produtos homogêneos. Ex. Coca-Cola, McDonald’s. Esta lógica tem dificuldades com os desafios ecológicos e uma desconexão com as demandas do território, além de crises nas relações de trabalho que trazem como consequência problemas de saúde, suicídios, entre outros. A EFC visa eliminar essas fraquezas, trazendo recursos de proteção em espaços que, apesar de territorializados, não estão desconectados do mundo. Um exemplo é o Ecopolo de produção orgânica de alimentos na França, que realiza uma organização e cooperação entre territórios. Já os grupos globais são centralizados.
Ecopolo no Norte da França: reestruturação de território onde se instalavam minas de carvão, inserindo uma lógica de serviço e bem-estar alimentício. Além da produção de alimentos, há serviços de hospedagem e acolhimento de turistas, escola de gastronomia, entre outros. É uma plataforma que complementa, e não desestabiliza. Para atribuir este julgamento de valor à estas plataformas, é necessário o desenvolvimento de uma governança e análise de território.
Objetivo do trabalho como fonte de valor para a empresa: exemplo da empresa de telefonia. O beneficiário não é apenas cliente, e sim coprodutor.
Novos princípios de governança: Os recursos materiais são numerados e há uma transferência de propriedade, porém a dinâmica imaterial não pode ser medida, comprada nem possuída. Exemplo: medir a confiança entre os clientes, narrativa de uma empresa. Estes elementos não estão ligados à gestão contábil, e sim ao nível de confiança do desenvolvimento da empresa. Feixes de indícios através de interpretações dos sinais mais fracos, em conjunto, mostra que são significativos. Indicadores mensurados e reagrupados. Instauração de lógicas de reparação. A projeção dos recursos imateriais é para longo prazo, envolvendo parceiros e território. A integração questiona as competências dos dirigentes de empresas, pois é necessário aceitar o desconhecimento da trajetória proposta para progredir. Quanto mais imaterial, mais o valor contábil se desprende do valor econômico.
Diferenças entre gestão e direção: Na gestão/management, o foco é na atividade. Permite ativar o processo de reflexão que permite se libertar do que a lógica da ferramenta impõe.
A escuta na EFC: Na EFC, a trajetória não é fixa, tudo está em constante movimento, sendo transitório e evolutivo. Desta forma, não existe cooperação sem escuta, sendo uma decisão. É necessária uma mudança de paradigma, pois o foco está na disponibilidade da escuta, e não no controle. É indispensável uma mudança no consumo de vida e um reposicionamento do território. Não é um modelo a ser seguido para dirigentes, e sim democrático, tendo o Clube da EFC como um espaço de reflexão.