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Clube EFC RIO

Resumo 1º Seminário e 5º Fórum da EFC

No dia 19 e 20 de agosto tivemos o 1º Seminário e o 5º Fórum da Economia da Funcionalidade e da Cooperação – Rio, respectivamente, com a presença ilustre de Sandro De Gasparo, do Instituto Europeu da EFC e do ATEMIS.

O 1º Seminário teve como temática o percurso para o modelo da EFC, tratando do trabalho de acompanhamento dos dirigentes de empresas em direção à EFC. O Fórum deu continuidade à temática, aprofundando nos dispositivos de acompanhamento e intervenção de empresas, com apresentação de um caso real.

A seguir, um resumo do principais tópicos tratados nos dois encontros. Colocamo-nos a disposição para conversar mais a respeito e, sobretudo, reflexão de ideias e temas para projetos cooperativos.

Seminário – 19 de agosto de 2019, das 9h às 17h

O 1º Seminário da EFC teve como temática o percurso para o modelo da EFC. O seminário se iniciou com uma apresentação sobre os princípios da EFC e se estendeu por toda manhã, através de um debate com questões sobre o tema. Sandro começou tratando do Modelo Econômico atual, composto por três dinâmicas: real, financeira e institucional. A dinâmica da economia real é de criação de valor – como responder às necessidades das pessoas (alimentação, moradia, saúde, cultura, mobilidade, etc)? Ele destaca que economia não é apenas finanças, mas sim o processo de criar valor frente às necessidades da sociedade. A segunda dinâmica da economia é a financeira, mais fácil de ser entendida por todos. A terceira dinâmica é a institucional, composta por regras, convenções, dispositivos, leis que acompanham a dinâmica social.

A partir dessa introdução sobre Economia, Sandro De Gasparo entrou nos três aspectos principais da Economia da Funcionalidade e da Cooperação: modelo econômico, funcionalidade e cooperação. Ao tratar do Modelo Econômico ele destaca a importância de criação de valor focada na funcionalidade, no valor do uso, através da performance de uso. Essa abordagem trata, portanto, também do segundo aspecto da EFC: funcionalidade. Para atender ao desenvolvimento sustentável é importante um “efeito tesoura”, isso é, diminuição dos recursos materiais (produção de bens materiais) e crescimento dos recursos imateriais. Para tanto, diferente da indústria atual baseada na produção de bens materiais, é preciso uma dinâmica de servitização. O serviço precisa estar como questão principal, através do aumento do valor do uso, sem necessariamente haver bens materiais. Essa dinâmica do serviço transforma a questão do trabalho, entrando portanto no terceiro aspecto da EFC: cooperação.

Sandro faz uma análise histórica, abordando o modelo industrial atual como resultado do taylorismo, que tem como foco a produção de bens e onde a engenharia é responsável por dizer o que é preciso ser feito, com foco no trabalho prescrito. A questão do serviço mais cooperação leva em conta a atividade do cliente-beneficiário. Um modelo baseado em serviço muda a posição do trabalhador, ele é que ficará em primeiro lugar para criação de valor, não mais o sistema técnico (as máquinas e o trabalho prescrito). Portanto, a primeira condição de criação de valor está na relação entre o trabalhador e o cliente. Isso porque a EFC tem sua centralidade no trabalho, em novas formas de relações profissionais e econômicas de trabalho, no engajamento da subjetividade do trabalho, da saúde mental. Assim, é necessário questionar o trabalho e o seu lugar. A cooperação é a maneira de pensar nas relações sociais, nas relações de poder, mais baseadas no reconhecimento do trabalho real. A cooperação é PELO trabalho, esse é o centro do modelo. Sandro destaca ainda que a EFC não é um modelo, é uma maneira de pensar que transforma todas as coisas.

Alguns obstáculos ao modelo foram levantados. O primeiro deles está relacionado à ergonomia, uma vez que o trabalho de intervenção não tem como perímetro a economia. O segundo obstáculo refere-se à economia propriamente dita, uma vez que os economista não possuem interesse na centralidade do trabalho, sendo necessário um trabalho multidisciplinar. O terceiro obstáculo refere-se a um víeis contraditório, isto é, existe um acesso privilegiado às grandes empresas (através de sindicatos e da facilidade de financiamento), porém não é o campo mais fácil de se ter experiências. As grandes empresas são dominadas pelo modelo econômico atual, focado no financeiro. Portanto, para se iniciar experiências no modelo da EFC, o caminho proposto é através das PMEs (pequenas e médias empresas). Dessa forma, há uma grande dificuldade das empresas mudarem seu ponto de vista sobre a questão do trabalho e, principalmente, de mudarem sozinha, sem uma mudança também do seu ecossistema. Sandro traz, então, a questão da Responsabilidade Territorial da Empresa (RTE).

Após essa “introdução” sobre os princípios e aspectos da EFC, que demandou todo o período da manhã, Sandro apresentou como é o trabalho de acompanhamento dos dirigentes. O trabalho de acompanhamento é o primeiro trabalho de formação de uma comunidade. Nesse momento houve um questionamento, sobre a questão dos clusters, como uma espécie de ambiente cooperativo. Sandro responde esse levantamento fazendo uma diferenciação entre cluster e comunidade. Destaca que o cluster tem uma perspectiva muito industrial. O território surge como uma oportunidade industrial, sem relação íntima com o território em si. Sua concepção vem do “papel” e não da experiência, assim como sua formação está relacionada ao poder público. Já a comunidade vem da dimensão da experiência, de uma história local, de relações, engajamento e uma cultura territorial.

Em seguida Sandro apresenta o Radar do trabalho de acompanhamento em direção à EFC, composto por 8 etapas interdependentes. A primeira etapa é sobre os limites do modelo atual, com um trabalho de garantir a convicção dos dirigentes sobre a necessidade do desenvolvimento sustentável.

A segunda etapa é onde se refletem sobre as externalidades positivas e negativas. As externalidades são efeitos não desejados, isto é, algo que não se esperava como resultado. Um exemplo de externalidade negativa é a degradação ambiental, os gases de efeito estufa. Não se deseja isso, mas é uma consequência às atividades insustentáveis. Um exemplo de externalidade positiva é a melhoria do bem estar social de uma esposa cujo marido arrumou um emprego. Também não se esperava isso diretamente, mas a reinserção social de um indivíduo pode ter efeitos positivos também em seu meio, sobretudo familiar. Sendo assim, nessa primeira etapa do acompanhamento é importante analisar as externalidades e as fontes de valor, principalmente as positivas.

A terceira etapa diz respeito aos recursos imateriais estratégicos, refletindo sobre a servitização como resposta ao modelo industrial atual. Sandro destaca que no modelo industrial temos uma segmentação dos saberes, onde a força de trabalho é o foco. A empresa não se responsabiliza pela saúde, por exemplo, é de responsabilidade do poder público (das leis e do sistema de fiscalização), sendo encarada apenas como uma externalidade. Com o foco em recursos imateriais a saúde é uma questão estratégica, assim como a reputação e a qualidade da cooperação. Sem confiança não se produz serviço. Portanto é preciso desenvolver outras competências, de saberes teóricos e práticos, para se relacionar, escutar, criar uma cultura mais forte.

A quarta etapa é sobre a performance de uso dos recursos materiais. Portanto, é feita uma análise entre as etapas 2, 3 e 4, através de uma compreensão sobre o USO, sem pensar ainda em solução, mas reconhecendo as dimensões do valor que já existem. Sandro destaca que há sempre mais valor no trabalho real do que a empresa consegue reconhecer. Na ergonomia assume-se que o trabalho real sempre gera mais valor que o trabalho prescrito, por exemplo funcionários técnicos que também ajudam os colegas, antecipam serviços, coordenam e resolvem alguma atividade emergente, etc). Nessa etapa também é importante avaliar o processo no cliente, a forma de uso do cliente. O que é feito pelo cliente? Quais os valores de uso? Portanto, não é uma etapa de invenção de novos valores, mas de reconhecimento das potencialidades de valores existentes.

A quinta etapa é sobre as soluções integradas de vens e serviços, onde o intuito é descobrir como integrar os valores nas competências, nas relações, etc. A sexta etapa, analisada em conjunto com a quinta, é sobre o ecossistema cooperativo territorial. Uma vez que não tem mais a lógica de mercado, a solução não é só de uma empresa que faz todo o perímetro de solução integrada, mas podem ser de várias empresas ou entidades. Portanto, a reflexão é: Como vou participar/contribuir para responder às necessidades territoriais? Na lógica dos recursos imateriais, baseada na servitização, o que é o centro não é mais a máquina e a produção, mas as pessoas que não são substituíveis, é preciso confiança, saúde, relações, etc. Dentro dessa perspectiva do imaterial, surge a questão da autoridade. Qual a forma do exercício legítimo do poder? A autoridade para ser legítima tem que ser atribuída a pessoa, o que é diferente de subordinação. Deve haver acolhimento, poder de aceitação do conselho, do que se deve fazer. A cooperação precisa permitir entrar no trabalho e reconhecer o outro. Sandro trata ainda da questão da justiça, que precisa refletir sobre a igualdade e a equidade. A resposta deve mudar conforme à situação, necessitando engajamento e autoridade.

A sétima etapa, é sobrea diversificação do fluxo de receitas e de investimentos. Como se traduz valor real em valor monetário? Ainda, o que o ecossistema/território precisa? Essa análise deve ser feita em relação às externalidades. Por fim, a oitava etapa trata da governança, do engajamento e das convenções cooperativas, isto é, normas, regras, contratos necessários para um ecossistema cooperativo.

5º Fórum da EFC – 20 de agosto de 2019, das 9h às 17h

O 5º Seminário da EFC teve como temática o trabalho de acompanhamento de empresas em direção ao modelo da EFC. Sandro iniciou tratando da questão da servitização, que não é sinônimo de setor de serviços, mas a maneira de reintroduzir no processo de produção a questão da finalidade. Quais as necessidades tentamos responder? Sandro destaca a frenesia do modelo econômico, onde compramos matéria, não mais soluções. A finalidade da produção não mais responde às necessidades da vida. Temos como exemplo os carros, cuja finalidade deveria ser a mobilidade, mas nos deixa cada vez mais presos em congestionamentos; ou a comida, que não mais representa saúde e bem estar. Portanto, é preciso discutir esferas funcionais, através da criação de valor sobre a performance de uso (saudável, pertinente, sustentável). Devemos discutir, portanto, mobilidade, não mais o uso de carros.

A EFC responde a como crescer economicamente sem estar ligado aos recursos materiais, ou sem estar dependente desses bens materiais. A criação de valor não passa necessariamente pela criação de objetos. Portanto, através da dinâmica do serviço ocorre uma transformação dos saberes e da centralidade da criação de valor. O serviço está ligado às necessidades e condições das pessoas ao uso. É preciso entrar em uma relação com o usuário/beneficiário, através de uma produção de valor que ocorre por competências diferentes ao modelo industrial. Toma mais tempo, mais escuta, sem necessariamente ter fluxo de matéria. Necessita-se de uma relação de confiança para se produzir serviço, portanto cria-se sempre mais valor. Dessa forma, constrói-se uma cultura comum, um ponto de vista comum. Uma nova forma de organização é gerada, através do reconhecimento do trabalho de cada um e todos podendo participar. As esferas funcionais, portanto, rompem setores como porta de entrada. O foco se dá nas grandes funcionalidades (saúde, mobilidade, cultura, etc). Os grupos são territoriais, e não setoriais. Isso porque é preciso um patrimônio imaterial territorial, que vem através de uma história, experiencias, relações e engajamentos, uma cultura, trazendo uma noção forte de unidade e pertencimento.

Nesse sentido Sandro destaca a importância dos movimentos não serem tratados como aleatórios. Se é aleatório não se percebe valor. A avaliação da racionalidade, sob a forma de organização, é que dá o valor. Em seguida, responde a uma questão sobre a vocação de um território. Questiona: quem decide a vocação? Isso traz um risco de já ter decidido a finalidade, voltando a lógica do setor, segmentando e concentrando um território e um único setor. Isso gera forte dependência, massificação dos meios produtivos. Deu o exemplo de uma cidade do norte da França, de que o dia que as minas fecharam, a cidade virou um deserto social. Portanto, é preciso um ecossistema cooperativo, para que o território tenha autonomia.

Na sequência, Sandro apresentou os tipos de dispositivo de acompanhamento de empresas em direção à EFC, dando exemplo para cada um deles. Os dispositivos apresentados foram: grupos de trabalho temáticos; acompanhamento da constituição dos ecossistemas cooperativos; dispositivos de avaliação e pesquisa; intervenções em empresas; dispositivo de profissionalização; coaching/acompanhamento da equipe de direção; animação dos clubes territoriais.

Finalmente, algumas questões foram levantadas, e Sandro finaliza destacando a importância de continuarmos esse trabalho de debate, através do engajamento e da cooperação entre pessoas. A partir daí, começarmos um trabalho ativo através de um grupo/clube direcionando grupos temáticos, para discussão, reflexão de trajetórias territoriais e de trabalhos de acompanhamento e intervenção.